Quando os chefes de Estado das nações do hemisfério se reunirem em abril em Santiago, Chile, um item que estará na agenda de quase todos eles é o provável lançamento das negociações para a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA).
Uma das mais ambiciosas iniciativas econômicas já lançadas, o processo da ALCA visa nada menos que atingir um acordo até o ano 2005 para a remoção das barreiras de comércio entre 34 países no hemisfério.
Ultimamente, a atenção do público em relação à ALCA tem se focalizado na disputa política que ocupa as manchetes dos jornais nos Estados Unidos sobre a legislação "fast track"*. Está bastante claro que seria dado um impulso às negociações da ALCA se fosse concedida ao governo dos Estados Unidos a autoridade para negociar acordos de comércio antes da cúpula de Santiago. No entanto, mesmo que o "fast track" seja adiado, os governos podem partir das bases estabelecidas nos últimos três anos para fazer um progresso significativo.
Boa parte desse trabalho preparatório esteve a cargo de 12 grupos de trabalho intergovernamentais com o apoio técnico de um Comitê Tripartido, composto pelo BID, a Organização dos Estados Americanos e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe. Esses grupos de trabalho reuniram um conjunto sem precedentes de bases de dados, estudos e inventários relacionados ao comércio e construíram uma estrutura para as negociações que serão realizadas.
Esse estágio preliminar foi até agora bem-sucedido e representa sem dúvida o componente mais avançado da agenda hemisférica originalmente criada em Miami, em 1994, durante a Cúpula de Chefes de Governo. O que explica esse êxito?
A primeira razão é que a ALCA está sendo construída com base numa convergência de interesses. Numa palavra, as nações da América Latina e do Caribe estão hoje quase que uniformemente comprometidas com o livre comércio e o regionalismo como poderosos instrumentos de desenvolvimento.
Em segundo lugar, o processo da ALCA possui uma meta clara -- um acordo até 2005 --, bem como um compromisso no mais alto nível político. Além disso, tem um plano detalhado de ação, com termos de referência precisos, marcos de desempenho e encontros pré-programados de técnicos, vice-ministros e ministros.
Finalmente, a decisão de usar o Comitê Tripartido OEA/BID/CELAM como fonte de apoio técnico em vez de uma estrutura mais formal e cara provou ser uma boa idéia.
É importante ter em mente ao entrarmos no próximo estágio que acordos eficazes e duradouros precisam estar baseados em boas negociações. Para isso, os governos da região precisam ter acesso a financiamento para cooperação técnica de entidades de desenvolvimento a fim de fortalecer ainda mais os órgãos relacionados ao comércio e outras instituições governamentais. Infelizmente, a demanda de cooperação técnica não reembolsável está ultrapassando os recursos disponíveis. Os governos, portanto, talvez tenham que considerar o uso de financiamento reembolsável para apoiar o desenvolvimento institucional abrangente e integrado na área de comércio. Afinal, o retorno desse tipo de investimento é considerável, dado o impacto que as negociações de comércio têm sobre o setor privado e a economia nacional.
Outros fatores estarão bastante ligados à sustentabilidade de um acordo quanto à ALCA. Um deles é a melhoria das comunicações entre o governo e os setores empresariais e trabalhistas. Outro são as campanhas de educação nacionais e hemisféricas sobre os benefícios do livre comércio, bem como as avaliações realísticas dos custos e maneiras de lidar com eles. O processo de negociação da ALCA precisa também levar em consideração o que ocorre nos esquemas de integração sub-regional que freqüentemente têm objetivos mais amplos e profundos; é legítimo esperar que, para os países membros, eles sejam prioritários.
Por fim, a extensão da capacidade dos países de maximizar os benefícios da ALCA e minimizar seus custos dependerá da habilidade que demonstrem de consolidar a primeira rodada de reformas econômicas e trabalhar com vigor pela segunda geração de reformas, especialmente na área social.
* Os autores são, respectivamente, o chefe da Divisão de Integração, Comércio e Assuntos Hemisféricos do BID e o coordenador do apoio técnico à ALCA, na mesma divisão.
* Legislação que dá autoridade ao presidente dos Estados Unidos para negociar acordos de comércio sem possibilidade de emendas pelo Congresso.