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Em busca da melhor estratégia

Claudio Castro, que foi até recentemente assessor principal do BID para educação, é hoje presidente do conselho consultivo da Faculdade Pitágoras, empresa de educação superior que oferece cursos diretamente a 15.000 alunos e serviços de apoio a outras 260 escolas. A Faculdade Pitágoras assinou há pouco tempo uma parceria com a Universidade de Phoenix, líder dos Estados Unidos em ensino universitário interativo. A parceria criará uma instituição brasileira de ensino superior visando oferecer quatro anos de faculdade em 50 campi planejados espalhados pelo Brasil.

Castro é autor de uma extensa obra sobre tecnologia na educação e sobre a luta para reformar as universidades latino-americanas. Atualmente, trabalha num livro que analisa a possibilidade de aplicar o conceito de ensino superior de curta duração (community colleges ) à América Latina.

BIDAmérica: A educação à distância com base na Internet pode realmente substituir a sala de aula universitária?

Depende do tipo de instrução e do tipo de estudante. Há duas questões que são decisivas. A primeira é a idade e o nível educacional dos estudantes. A segunda é a duração do programa.

Não há como levar jovens com secundário incompleto a fazer um curso longo à distância. Eles simplesmente não têm a disciplina nem a concentração necessárias para trabalhar sem supervisão. Além disso, quando se trata de um programa de graduação de quatro anos, o processo de socialização é muito importante. A companhia dos colegas, o trabalho coletivo, as observações e o estímulo dos professores – tudo isto é essencial.

Portanto, qualquer curso longo exige estudantes amadurecidos e uma metodologia semelhante à da Open University britânica, onde os estudantes têm sessões pessoais duas vezes por semana. Se não for assim, o curso acaba com uma taxa de evasão extremamente alta.

BIDAmérica: Então não é realista pensar em educação exclusivamente pela Internet?

Exatamente. Mas ao mesmo tempo há coisas que se podem fazer muito bem por computador. A Internet é ideal para cursos de extensão curtos e para a educação permanente: cursos sobre técnicas para vender imóveis, programação de computadores em linguagem C++, meditação transcendental – qualquer coisa, desde que o curso seja curto.

Também se pode usar a Internet eficazmente em cursos universitários tradicionais, mas somente se for possível pagar por métodos como os usados pela Universidade de Phoenix. Esta universidade parece ter uma das taxas de evasão mais baixas na educação à distância, mas eles só trabalham com estudantes amadurecidos e investem pesadamente em tutoria por e-mail. Têm turmas com apenas 12 alunos e o instrutor dá muita atenção a cada um. Se o aluno se atrasar um dia para entregar um trabalho, recebe um e-mail ou um telefonema perguntando o que foi que aconteceu.

Isso mostra que um curso mais longo pela Internet pode funcionar. Mas esse tipo de curso ainda exige contato direto, como na Open University, ou tutoria muito intensa, como na Universidade de Phoenix.

BIDAmérica: Como, na sua opinião, esse fenômeno vai evoluir na América Latina?

Acho que, primeiro, vai haver uma explosão de educação permanente e cursos de extensão on-line, porque estes são fáceis de organizar. Vão crescer na região da mesma maneira desorganizada e caótica que cresceram as ONGs. O grande problema é que aluno talvez não saiba o que está recebendo. Vai precisar de alguns filtros, algum mecanismo de controle que lhe permita determinar o valor do que está comprando.

Em menor escala, o mesmo ocorrerá com programas universitários. Haverá muitas ofertas, a maioria delas honesta mas sem interesse e sem vitalidade, como aliás a maior parte da educação superior na América Latina. Haverá uma minoria de iniciativas muito boas e outra minoria simplesmente desonesta. A maioria será o espelho da mediocridade que já se vê na educação superior da América Latina.

BIDAmérica: As universidades americanas e européias poderiam tirar estudantes das instituições latino-americanas com essas ofertas?

Em princípio, poderiam. Creio que a UNext (uma empresa que está preparando uma ambiciosa oferta de cursos de treinamento com base em material de universidades americanas de elite) tem uma estratégia irresistível, porque até gente que não sabe de nada já ouviu falar de Yale, Harvard ou Stanford.

Mas não creio que esses projetos ameacem as universidades latino-americanas, porque por enquanto a UNext só está oferecendo cursos de extensão e se concentrando quase exclusivamente no mercado educativo empresarial. E na América Latina as universidades só incidentalmente entram no ramo dos cursos de extensão.

Se quiserem oferecer diplomas universitários regulares, as instituições estrangeiras terão de enfrentar requisitos muito severos para serem reconhecidas nos países latino-americanos. No Brasil, por exemplo, onde as autoridades só agora estão começando a considerar o credenciamento de programas universitários à distância, esses programas estão sendo sujeitos a intenso escrutínio. Além do mais, na maioria dos casos os cursos terão que ser traduzidos para o português ou o espanhol.

Mas para os cursos de extensão, a maioria dos países não exige credenciamento algum. Nesse caso, a chave do sucesso é um nome ou uma reputação em que as pessoas confiem. Portanto, acho que as instituições estrangeiras vão atacar principalmente o filão dos cursos curtos, e não programas de graduação de quatro anos.

BIDAmérica: Já que se espera tanta concorrência, o que pode garantir o êxito de um fornecedor de ensino pela Internet?

Qualidade e escala. Centenas de instituições já estão desenvolvendo cursos à distância, mas a maioria gasta menos de US$1.000 para preparar cada curso, com resultados previsíveis. É basicamente uma indústria de fundo de quintal. Mas se se gastar US$100.000 para elaborar um curso de padrão internacional, pode-se vendê-lo a milhares de estudantes. Esta é a lição do Telecurso . Eles gastam US$1.000 por minuto em seus programas, porque exigem uma imagem com uma qualidade tão alta quanto a da melhor programação comercial e roteiros tão competentes quanto os do Discovery Channel americano. O resultado é que conquistaram uma audiência enorme.

De modo que ao pensar grande, multiplicam-se os custos por 100 e os alunos por 1.000, e acaba-se com uma educação muito barata por aluno.

A outra chave para conseguir alta escala são as parcerias. Até a UNext, que é um gigante, está apostando em empreendimentos conjuntos com instituições locais fortes em cada país. Na maioria dos casos, esses parceiros locais serão privados, porque as universidades públicas não têm a flexibilidade administrativa necessária para lançar um projeto desse tipo.

Por fim, os empreendimentos com fins de lucro provavelmente terão uma vantagem sobre os que não têm fins lucrativos, porque, para fazer algo realmente sério, é preciso muito dinheiro. E são muito poucas as ONGs que conseguem levantar US$30 milhões junto a investidores, como ocorreu com a Fundação Roberto Marinho (do Grupo Globo), que conseguiu uma doação nesse valor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.

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