É possível ganhar a vida negociando com vendedores ambulantes ou microempresários incipientes, sem capital mas com vontade de trabalhar? “Sem dúvida”, afirma enfaticamente Michael Chu. Depois de duas décadas como executivo em Wall Street, este pioneiro das microfinanças resolveu arriscar-se no mundo dos negócios por conta própria. Decidiu que ao oferecer serviços financeiros à população pobre poderia usar o mercado para produzir um impacto social.
Os números contam a estória. Mais de 50% da população mundial – cerca de 3 bilhões de pessoas – vive com menos de US$2 por dia. É difícil imaginar um outro empreendimento comercial com um número maior de clientes potenciais. Assim sendo, por que os bancos comerciais tradicionalmente ignoram esse mercado?
Descubra o cliente
“Falta informação”, foi a resposta de Chu. “Essa população é desconhecida e, mesmo quando sua existência é reconhecida, as pessoas operam sob premissas falsas”. Pensava-se, por exemplo, que os pobres não pagavam suas contas. Na verdade, essas pessoas são mais responsáveis com dinheiro do que as que têm cartões de crédito. Também se pensava que os pobres careciam de conhecimento suficiente e que necessitariam de horas de treinamento para entender o sistema bancário. “Qualquer pessoa capaz de sobreviver em economias com uma inflação de três ou quatro dígitos está preparada”, observou Chu.
Pouco a pouco, os bancos comerciais passaram a superar esses e outros obstáculos como, por exemplo, a ausência de ativos para garantir o crédito, e ficou claro que “servir aos pobres pode, sim, gerar benefícios econômicos”. Para Chu, o aspecto mais revolucionário é o fato de que servir aos pobres como clientes gera os mesmos benefícios que servir a qualquer outro segmento da população: atrai concorrência, cria uma indústria e, o que é mais importante, faz com que os pobres se tornem parte do mundo dos negócios.
Da caridade aos negócios
Essa abordagem significa que os pobres deixam de ser beneficiários passivos de assistência para tornar-se clientes ativos, que demandam serviços. O caso da Bolívia, país no qual as microfinanças e o microcrédito prosperaram, é um bom exemplo. “Em 1986, os bancos ignoravam completamente as necessidades de uma chola que vendia seus produtos na esquina e, hoje, há bancos competindo por seus negócios”, diz Chu.
Segundo ele, a definição do que constitui um negócio está mudando. Até agora, os negócios costumavam ser definidos pelos bens e serviços produzidos para o terço mais rico da população mundial – ou 2 bilhões de pessoas –, no qual estão os consumidores do primeiro mundo, por assim dizer, e as elites do terceiro mundo. Hoje, a indústria microfinanceira está chegando à base da pirâmide, onde há quase 4 bilhões de indivíduos. A riqueza produzida por essa indústria poderia igualar ou superar aquela gerada pelos 2 bilhões de indivíduos que formam o topo da pirâmide.
Michael Chu nasceu na China, foi criado no Uruguai e estudou nos Estados Unidos. É diretor-gerente da Pegasus Venture Capital – firma de investimentos voltada para empresas com perspectivas de crescimento na América Latina – e professor da Escola de Administração da Universidade de Harvard. Também foi presidente da ACCIÓN International, uma das principais redes de instituições microfinanceiras. Em setembro, participou como conferencista convidado do Fórum das Américas – programa do BID criado em 1995 –, no qual são feitas apresentações sobre assuntos prioritários para o desenvolvimento da América Latina e do Caribe.