Dias antes da assinatura histórica do empréstimo, a única estação de rádio da província de Darién, Panamá, localizada num modesto edifício de concreto na pequena comunidade de Metetí, fazia um chamamento urgente:
"Crianças, homens, mulheres, fazendeiros, índios, organizações, motoristas de ônibus e caminhão, lenhadores, comitês de saúde e água, público em geral: Darién precisa de vocês. O desenvolvimento socioeconômico de Darién está em suas mãos."
A estação Voz sem Fronteiras não estava exagerando. O empréstimo de US$70,4 milhões que seria assinado em 21 de fevereiro financiaria um programa de desenvolvimento sustentável para Darién e pavimentaria os 184 quilômetros de sua estrada de terra, ambos sonhos de longa data dos 60.000 cidadãos da província. Realizaria esses dois objetivos com a participação de grande parte da população da região e ao fazê-lo tornaria esse canto esquecido e obscuro das Américas um modelo para o resto do hemisfério.
E assim eles vieram. Cerca de 1.200 pessoas, provenientes das humildes comunidades indígena, afro-americana e latina, viajaram de ônibus, caminhão, carro, barco, canoa, a cavalo ou a pé até Metetí, local da cerimônia de assinatura. Alguns viajaram dois ou três dias para participar do evento. Foi a maior multidão já reunida na região e provavelmente a maior já reunida para a assinatura de um empréstimo do BID.
A manhã nublada de domingo ameaçava chuva. Funcionários da Fundação Pro Niños de Darién, que organizaram o evento, levantaram uma tenda na quadra recreativa em frente da estação de rádio para proteger as dezenas de autoridades representando o governo panamenho, as organizações não-governamentais, as comunidades locais e o BID. Mas o tempo ajudou e acabou sendo um típico dia de Darién, úmido e quente.
Nesta mesma cidade, exatamente há dois anos, o presidente Ernesto Pérez Balladares, do Panamá, e o Presidente do BID Enrique V. Iglesias tinham feito perante os líderes comunitários a promessa de pavimentar a estrada de Darién como parte de um plano de desenvolvimento integrado da região. Ao mesmo tempo, concordaram em não estender a estrada os restantes 50 quilômetros pelo Parque Binacional Darién até a fronteira com a Colômbia. Depois de dois anos de estudos econômicos e ambientais, consultas intensivas feitas por uma equipe de antropólogos junto a residentes em 45 comunidades diferentes e o desenvolvimento de um amplo plano de gestão do uso da terra para essa região biologicamente diversa e ambientalmente sensível, Pérez Balladares e Iglesias voltavam para assinar o acordo de financiamento.
Mas o momento longamente esperado sofreu um atraso pequeno e inesperado. Ao sair da Cidade do Panamá, o helicóptero que levava Pérez Balladares e Iglesias atingiu um pelicano e os dois presidentes tiveram que se transferir para outra aeronave. Depois de pousar finalmente em Metetí, num campo a um quilômetro do local da assinatura, uma caravana de veículos utilitários os levou até a estação de rádio. Os dois presidentes, em mangas de camisa, passaram pelos fotógrafos no meio dos aplausos de uma multidão e caminharam até a grande tenda branca. Tomaram assento à mesa coberta por uma toalha branca bordada proveniente da catedral católica de Metetí.
"Este projeto não é apenas outra estrada financiada pelo BID", disse Iglesias à multidão depois da assinatura. "É uma rota para desenvolver a região, proteger sua ecologia, explorar racionalmente seus recursos naturais e respeitar suas comunidades étnicas. Asseguro-lhes que este é o projeto do BID mais participatório que já fizemos", disse Iglesias.
Igualmente satisfeito estava Monsenhor Romulo Emiliani, bispo católico da província de Darién (ver o artigo na seção "Protagonistas"). Há anos, Emiliani ajuda os residentes de Darién a pressionar o governo a pavimentar a estrada que existe até a cidade de Yaviza, porque parte dela fica intransitável duante a temporada de chuvas, que dura nove meses, e a financiar o desenvolvimento na região. "Depois de tantos anos de sofrimento e marginalização, é mais do que hora de recebermos ajuda", disse ele à multidão. Mas em seguida avisou: "Com a assinatura deste acordo, chegou o momento. Todos nós prometemos tornar este projeto uma realidade. Agora depende de nós."
O Programa de Desenvolvimento Sustentável de Darién, que deverá levar cerca de seis anos para ser completado, financiará projetos produtivos e sociais, registro de terras e medidas para fortalecer os órgãos governamentais, além de pavimentar a estrada existente. Uma diretoria consultiva, composta de representantes de organizações locais, nacionais e internacionais, supervisou o desenvolvimento do programa e continuará a fiscalizar sua execução.