Poucas coisas preocupam mais as pessoas na América Latina e no Caribe do que encontrar e manter um emprego.
Segundo Latinobarómetro, um levantamento feito por uma empresa independente de pesquisa de opinião em 17 países da região e divulgada no começo deste ano, 19 dos 100 consultados consideraram o desemprego o problema mais sério de nosso tempo. Outros 8% disseram que salários baixos são o problema número um e em média 65% de todos os entrevistados disseram que estão "preocupados" ou "muito preocupados" com perder seu emprego nos próximos 12 meses.
Quase todo mundo tem uma explicação para a escassez de empregos. As teorias vêm à tona em conversas entre trabalhadores, nos editoriais dos jornais e, invariavelmente, nos discursos de políticos em campanha. De fato, os políticos sempre proclamam conhecer as verdadeiras causas do desemprego -- e o segredo para sua erradicação imediata.
Mas as causas do desemprego são, na verdade, extremamente difíceis de isolar e iludem mesmo os economistas especializados em dinâmica do mercado de trabalho.
Essa foi a conclusão de um seminário que atraiu à sede do BID em Washington, D.C., em maio passado, algumas das principais autoridades em questões trabalhistas da América Latina. Intitulada "O emprego na América Latina: qual o problema e como enfrentá-lo?", a reunião consistiu num franco exame das incertezas que cercam o comportamento do mercado de trabalho.
Eduardo Lora, economista-pesquisador sênior no Escritório do Economista-Chefe do BID, abriu o seminário examinando as tendências do emprego que muitos especialistas identificam nos países da região. Em grande medida, essas tendências indicam que a ansiedade do público se justifica. Por exemplo, a taxa de criação de novos empregos diminuiu na década de 90 para uma média de 2,8% ao ano, cerca de meio ponto porcentual abaixo da taxa dos anos 80. E apesar das taxas de crescimento econômico mais altas experimentadas pela maioria dos países latino-americanos, o desemprego na verdade aumentou, de uma média regional de 6% nos anos 80 para cerca de 8% na década de 90.
Além disso, a taxa de emprego informal (gente com empregos não registrados, que não oferecem benefícios ou segurança) está aumentando. Entre 1990 e 1996, a porcentagem de empregados autônomos, trabalhadores domésticos ou pessoas trabalhando em empresas com 5-10 funcionários aumentou de 51,6% para 57,4%. Embora os salários reais tenham aumentado ligeiramente na maioria dos países latino-americanos desde 1990, eles subiram muito mais rapidamente para a mão-de-obra especializada do que para a de baixa especialização.
Surpresa desagradável.
Esses dados desapontam e confundem os economistas, que previram que as reformas macroeconômicas e o crescimento do PIB da última década empurrariam para baixo o desemprego e ajudariam a melhorar os salários dos trabalhadores não especializados. Segundo os participantes do seminário, há diversas explicações pelo menos parciais para essas tendências desanimadoras.
Primeiro, barreiras comerciais menores forçaram as empresas da região a se tornar mais eficientes a fim de se equiparar aos concorrentes globais. O acesso facilitado ao capital e a investidores estrangeiros permitiu que essas empresas modernizassem o equipamento e adquirissem nova tecnologia, tornando possível aumentar a produtividade sem contratar mais empregados. As companhias que estavam contratando funcionários buscavam trabalhadores altamente especializados, capazes de utilizar ao máximo as novas tecnologias -- muito embora a oferta dessa mão-de-obra seja escassa e os salários pagos a ela sejam mais altos.
Segundo, a restrição fiscal necessária para estabilizar as economias e atrair investimento estrangeiro forçou os governos a reduzir a folha de pagamentos do setor público, aumentando ainda mais o desemprego. O mesmo tipo de necessidade levou muitos governos a manter moedas de algum modo sobrevalorizadas -- prática que torna a mão-de-obra não especializada de um país comparativamente mais cara e portanto restringe a criação de empregos para esse segmento da população economicamente ativa.
Terceiro, muitos observadores acreditam que o crescimento do emprego na região está sendo refreado por sindicatos excessivamente agressivos e leis trabalhistas rígidas que fazem com que seja muito caro contratar e despedir empregados.
Ainda assim, mesmo essas hipóteses levantam indagações. Por exemplo, a teoria de mercado diz que em países onde as empresas consistentemente pagam salários altos para mão-de-obra altamente especializada, indivíduos e famílias respondem investindo mais em educação. Mas segundo Miguel Székely, economista do BID que apresentou um estudo durante o seminário, há poucas evidências de que os latino-americanos estão investindo mais em educação. Por que? Há inúmeras explicações possíveis, diz Székely, a começar pela oferta muito limitada e os altos custos de educação de boa qualidade na região. Mas o tema continua difícil de ser decifrado.
Da mesma forma, a noção de que os mercados de trabalho da região estão manietados por sindicatos poderosos não se baseia em fatos. "A participação em sindicatos na América Latina é comparativamente baixa e está diminuindo, além de que são fracos os mecanismos de negociação de contratos coletivos de trabalho", disse no seminário Gustavo Márquez, especialista do BID em mercado de trabalho.
Em muitos países as proteções do trabalhador são executadas mais através de leis e regulamentos trabalhistas do que por meio de contratos negociados por sindicatos poderosos e efetivos. E embora essas leis tendam a ser muito restritivas na América Latina, simplesmente não há provas suficientes de que elas sejam responsáveis pelas taxas de desemprego persistentes da região.
Essas são apenas algumas das áreas que, segundo os especialistas do BID e outros participantes do seminário, exigirão pesquisas mais profundas antes que se encontrem respostas sólidas. No meio tempo, os formuladores de políticas públicas e o público em geral devem se precaver contra generalizações radicais sobre as causas do desemprego.