Tomás Engler, médico da saúde pública por profissão, é especialista sênior em saúde do BID desde 1987. Coordenou os estudos sobre idosos descrito na matéria "Aposentadoria ativa", organizou a Consulta Inter-Regional sobre Envelhecimento Ativo de junho último e está agora ajudando a desenvolver a agenda produzida durante essa reunião. Nos anos 70, Engler criou um programa de saúde para adultos no Ministério da Saúde do Panamá.
BIDAmérica :Já foi dito que as nações industrializadas se tornam ricas antes que envelheçam, enquanto os países em desenvolvimento vão envelhecer antes de se tornar ricos. Quais são as conseqüências?
Engler : Espero que haja crescimento econômico em nossos países e que os seus benefícios sejam distribuídos por toda a sociedade, incluindo os idosos. Mas isto demorará algum tempo.
Enquanto isto, vamos enfrentar um fenômeno demográfico semelhante ao que ocorre nas nações industrializadas, mas em um contexto de pobreza muito maior. Adultos idosos, que possuem necessidades especiais, devem ser mais afetados por este processo do que outros setores da população. Isto ocorre, em parte, porque as aposentadorias são muito baixas nos países latinos, até mesmo para aqueles em situação de adquiri-las; em alguns países uma grande proporção de idosos não faz parte do sistema formal de pensões. Como resultado, as pessoas trabalham duro para se aposentar e então têm que continuar trabalhando até o ponto em que não podem mais. Esses idosos também precisarão de serviços especializados nos setores de moradia, educação, atendimento médico e serviços sociais que em muitos casos não se encontram disponíveis.
BIDAmérica : As famílias latino-americanas cuidam melhor de seus idosos em casa do que as dos países industrializados?
Engler : Eu não acredito que sabemos o suficiente sobre os detalhes para fazer esta afirmação. A unidade familiar ainda é um forte valor na América Latina, mas o que tem criado obstáculos a ela são as pressões financeiras sobre as famílias. A menos que os idosos possam fazer contribuições valorizadas pelo resto da família, sua presença pode aumentar a pressão da pobreza. Mesmo em famílias que se encontram em uma boa situação, tais circunstâncias criam tensões.
Os estudos que realizamos na Argentina, Chile e Uruguai parecem comprovar que os idosos ainda dependem da ajuda de suas famílias para cobrir gastos com despesas médicas, vestuário e alimentação, mesmo quando cuidam do resto com sua própria renda. E muitos idosos trabalham para o seu próprio sustento.
BIDAmérica : Por que as propostas para aumentar a idade mínima de aposentadoria encontram tanta resistência na América Latina?
Engler : Em parte devido à teoria que quando os idosos permanecem empregados por mais tempo são obstáculo a que os mais jovens entrem no mercado de trabalho. Mas eu não conheço dados que confirmem essa afirmação. É um questão politicamente difícil, porque vários grupos profissionais, como as enfermeiras ou os policiais, vêem a sua aposentadoria antecipada como uma conquista, e qualquer político que retire tal beneficio provavelmente não será reeleito.
A ironia é que a maioria das pessoas que se aposentam antecipadamente nestes países simplesmente continua a trabalhar. Então o que temos que fazer é identificar quanto tempo as pessoas estão realmente trabalhando, e então desenvolver políticas trabalhistas que reflitam esta realidade. Uma vez que essas questões se tornem mais claras em termos de evidência empírica, então podemos iniciar um diálogo entre os jovens, as pessoas de meia-idade e os idosos que pode levar a um consenso sobre política de aposentadoria e a uma nova cultura da idade.
BIDAmérica : A comunidade médica da América Latina está preparada para atender as necessidades dos idosos?
Engler : Infelizmente precisamos desenvolver uma abordagem mais enfática nos cuidados preventivos para os idosos e na melhoria da qualidade e cobertura de serviços especializados para aqueles que os necessitam. Existe uma tremenda carência de treinamento geriátrico na América Latina, como existe nos Estados Unidos e outros países ricos. Poucas universidades incluem geriatria no seu currículo médico, apesar da demanda crescente por esses serviços. E esta carência se estende a médicos, enfermeiras, terapeutas físicos e todos os outros profissionais da medicina.
BIDAmérica : Qual é a situação de casas de repouso e asilos para idosos?
Engler : O setor público oferece uma variedade de instituições, mas a maioria delas se encontra em péssimas condições. A falta de recursos das instalações públicas é tão aguda que as famílias dos residentes são freqüentemente solicitadas a fornecer alguns itens básicos que não são providenciados, como lençóis ou alimentação. No setor privado, temos observado o crescimento de instalações de custo médio para pequenos grupos de pessoas, normalmente em antigas residências adaptadas para esse propósito.
No entanto, existem sérias preocupações sobre a qualidade do atendimento que é fornecido nesses lugares, assim como ocorre nos Estados Unidos, porque os proprietários freqüentemente procuram economizar em vários itens. Em diversos países existem regulamentações que não estão sendo observadas, porque as instituições de supervisão, encarregadas de verificar o cumprimento de tais regras, não possuem os recursos adequados. Desta forma, existe a necessidade de fortalecer esta capacidade de supervisão.
BIDAmérica : O que os países latinos podem aprender das nações industrializadas que já estão enfrentando a crise do envelhecimento da população?
Engler : Há diversas lições a aprender. Uma é a integração e coordenação dos serviços sociais e de atendimento médico, desenvolvimento urbano, transporte e outros nesta linha. Pode parecer óbvio, mas iss pode levar à construção de novos parques, por exemplo, que sejam equipados com bancos mais altos, o que torna mais fácil o acesso por parte de idosos ou deficientes físicos. Isso só ocorre se os planejadores urbanos estiverem em contato com os geriatras e com a população de idosos. Serviços bem coordenados também podem ser centralizados na casa das pessoas, ao invés de ter serviços fragmentados e dispersos.
A Finlândia e o Japão já fizeram muitas pesquisas sobre produtividade e trabalhadores idosos. Como são países com carência de mão-de-obra, possuem um incentivo para manter seus trabalhadores nos empregos por mais tempo e por isso desenvolveram grandes esforços no estudo de tópicos como ergonomia, que podem ter impacto sobre produtividade e satisfação no trabalho. Quando a capacidade física começa a declinar depois de uma certa idade, detalhes como, por exemplo, o desenvolvimento de alavancas mais longas podem resultar em menor esforço físico para realizar a mesma tarefa. Pessoas que começam a ter problemas de visão podem ser auxiliadas mediante telas de computador com letras maiores. Estas simples intervenções de baixo custo podem ter um grande impacto na produtividade e na prevenção de acidentes.