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Luzes e sombras

Milagros Belgrano Rawson
 

Nota do editor: A nova política de acesso a informações do BID cumpre as suas metas estabelecidas? Uma maneira de responder a essa pergunta é verificar se a nova política tornou mais fácil para as pessoas obter esclarecimentos para as suas dúvidas sobre projetos do BID. Com esse objetivo, a BIDAmérica pediu que a jornalista free-lance Milagros Belgrano Rawson escolhesse aleatoriamente um projeto e determinasse quanto conseguia descobrir sobre ele usando os canais de informação oficiais do Banco. Como o nosso propósito era testar a política de informações do Banco e não chamar atenção para um determinado país, substituímos todos os nomes e números do relato a seguir por dados fictícios. Ver os links à direita para uma resposta à avaliação de Belgrano (“Uma oportunidade de ver como estamos nos saindo”) e uma pesquisa on-line para os leitores.

Escolhi o projeto “Programa de Reforma de la Salud” (PRS), que está sendo implantado atualmente com um empréstimo de US$65 milhões do BID. Examinei primeiro as informações disponíveis sobre o projeto no site do BID. Na seção “Projetos”, encontrei uma página sobre o PRS que explicava que o seu objetivo é aumentar a cobertura dos serviços de saúde por meio de uma reforma da organização e dos esquemas de financiamento. O PRS tem como foco as populações mais pobres e fornece remédios gratuitamente.

A página do projeto também informava o número e a data de aprovação do empréstimo, assim como a quantia total desembolsada para o projeto até o momento (52%), o nome do especialista do BID encarregado do projeto e a agência executora no país beneficiário. No entanto, não havia nenhum número de telefone ou nome para contato. Enviei um e-mail para um assessor de imprensa na sede do BID pedindo esclarecimento sobre o montante do empréstimo, mas não obtive resposta.

Na parte inferior da página do projeto, encontrei 11 links para documentos adicionais. O mais longo deles (53 páginas) era a proposta de empréstimo original, que inclui uma análise detalhada dos problemas do setor de saúde do país. Sete dos links levavam a planos de aquisições ou notícias relacionadas ao projeto.

Compras e consultaria. Um link intitulado “Informações sobre aquisições” mostrou-se mais produtivo, levando a um banco de dados com uma quantidade impressionante de informações sobre o desempenho financeiro de todos os projetos ativos do BID. Na seção “Contratos concedidos” da página do PRS, descobri que 87 contratos de bens e obras haviam sido concedidos sob esse programa, além de 315 contratos de consultoria. Cada um deles levava a uma página com o nome da empresa ou consultor, o montante do contrato e o prazo em que ele deveria ser executado.

Essas páginas também contêm seções intituladas “Serviço principal” e “Serviço secundário”, que supostamente explicam o tipo de bem ou serviço que está sendo fornecido. Porém, em quase todos os casos, essas seções traziam duas ou três palavras (tipicamente “governo” ou “assistência técnica”) que não esclareciam quase nada sobre os bens e serviços de fato adquiridos. Com isso foi impossível descobrir quais tarefas seriam executadas por organizações como o “Sindicato de Madres” (“Sindicato de Mães”), que aparece na lista de contratos concedidos. Também não ficou claro se algum dos 315 consultores contratados para o projeto trabalhou em “capacitação e formação de recursos humanos”, “sistema de informação”, “disseminação de informações ou fortalecimento institucional”, ou outros títulos mencionados nos Anúncios Gerais de Aquisições na página do projeto. Solicitei informações mais detalhadas ao Centro de Informações Públicas do Banco, que só depois de vários e-mails respondeu que todas as informações de aquisições de que dispunha estavam apresentadas no site.

Ao examinar a lista de consultores, chamou-me a atenção, por exemplo, ter encontrado o nome de Gladys Arroyos, coordenadora geral da Unidade Executora Central do projeto, como consultora recebendo dois honorários, de US$6.231 e US$48.212, respectivamente. A mesma lista mostra que Rafael Peñaloza, chefe da Unidade de Financiamento Internacional, recebeu US$53.921 por seus serviços como consultor do projeto, enquanto Aníbal de la Torre, coordenador de Contratos e Aquisições, recebeu US$49.896 e a secretária de Arroyos, Mariela Gómez, recebeu US$4.525. Não ficou claro se essas pessoas são funcionárias do Ministério da Saúde e receberam também honorários de consultores, ou se estão nessas listas por outras razões.

Para tentar esclarecer essas dúvidas, recorri ao Escritório de Política e Coordenação de Aquisições do Banco, que supervisiona o cumprimento das políticas e procedimentos do Banco para aquisição de serviços de consultoria, bens e obras. Não recebi nenhuma resposta e recorri novamente ao Escritório de País do Banco no país mutuário, cuja única sugestão foi que eu entrasse em contato com a Unidade Executora do projeto no Ministério da Saúde, onde, porém, meus e-mails e telefonemas para Arroyos, Peñaloza, de la Torre e Gómez não foram respondidos.

Diante dessa situação, ficou difícil determinar os benefícios do programa PRS para o país. O Escritório de Avaliação do BID, que é encarregado de avaliar os resultados dos projetos, não tem relatórios de desempenho referentes ao empréstimo em questão, apesar de um relatório do BID de maio de 2003 ter alertado sobre a “escassa avaliação do impacto e falta de feedback durante o ciclo de projetos do Banco”.

As lacunas de informação são particularmente preocupantes pelo fato de o sistema de saúde pública do país estar em situação de colapso e de, em anos recentes, vários membros do Ministério da Saúde terem sido acusados de irregularidades por órgãos de controle nacionais. Ignacio Ramírez, por exemplo, médico e presidente da Associação Médica Nacional, diz que a reforma na assistência de saúde canalizada pelo governo no PRS “simplesmente alimenta estruturas administrativas e consultores parasitas”, e é difícil rebater as suas críticas devido à falta de informações sobre os resultados do projeto.

Alguma luz. Embora muitas de minhas solicitações de informação não tenham recebido resposta dos departamentos ou escritórios do BID que contatei, não acredito que isso tenha se devido a uma falta de disposição dos funcionários do Banco a aplicar as suas próprias políticas de acesso a informações. O problema é que esses departamentos não pareciam dispor de informações atualizadas sobre seus projetos e, portanto, não tinham como responder a pedidos de esclarecimento.

Acho que o site do BID é uma ferramenta essencial para oferecer ao público o acesso a informações sobre o Banco. Por isso, fiquei intrigada ao descobrir que a lista de funcionários inclui números de telefone, mas não endereços de e-mail, o que tornou consideravelmente mais difícil o contato com vários departamentos. Pedi os endereços de e-mail para o webmaster e para o Centro de Informações Públicas do BID, mas não recebi uma resposta satisfatória.

A base de qualquer política moderna de acesso a informações deve ser uma resposta rápida a mensagens recebidas por e-mail, mesmo quando o departamento ou escritório que receber a mensagem não tiver os documentos necessários para prestar o esclarecimento solicitado. Durante esta avaliação, recebi respostas para apenas 12 dos 25 e-mails enviados a escritórios e departamentos do Banco, o que representa uma taxa de retorno de 48%. E esse número inclui departamentos que responderam apenas para dizer que não tinham uma resposta para a pergunta.

“Os governos não devem questionar por que as pessoas lhes pedem informações”, disse há alguns meses a ex-vice-primeira-ministra sueca Lena Hjelm-Wallen. O acesso a informações públicas está sendo cada vez mais reconhecido como um direito dos cidadãos, e não deve ser limitado por interesses de membros do governo, observou ela. Nesse aspecto, o BID e alguns governos latino-americanos ainda têm um caminho considerável a percorrer.

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