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Dólares para todos?

Altos funcionários responsáveis pelas finanças públicas das Américas e economistas das instituições multilaterais reuniram-se para um intenso debate sobre dolarização durante um seminário recente sobre como os países podem enfrentar a turbulência nos mercados mundiais.

Durante o seminário, "Novas Iniciativas para Enfrentar a Crise Financeira Internacional", os ministros da Fazenda do México, Chile e El Salvador e altos funcionários governamentais responsáveis pelas finanças da Argentina, Brasil e Estados Unidos analisaram as vantagens e desvantagens de manter taxas de câmbio fixas ou flexíveis perante a volatilidade persistente dos mercados. O evento, realizado em Paris em março último, em conjunto com a reunião anual do BID, visava fornecer apoio técnico para os países que estavam formulando suas posições sobre o tema.

Em sua apresentação, o economista-chefe do BID, Ricardo Hausmann, argumentou que a flexibilidade da taxa de câmbio não tinha sido um benefício para a América Latina, resultando em taxas de juros reais mais altas e sistemas financeiros menores. Uma análise de como as taxas de juros se comportaram em 11 países latino-americanos entre maio de 1997 e outubro de 1998 - período que abrangeu os grandes choques causados pela crise financeira da Ásia, o colapso dos preços dos principais produtos primários e a crise da dívida russa - indica que elas variaram menos nos países com políticas de câmbio rígidas, como Argentina e Panamá. Resultados desse tipo contradizem as teorias convencionais.

Hausmann também disse que a credibilidade das moedas latino-americanas menores, sejam flutuantes ou fixas, é limitada. A prova disso é que nenhuma delas conseguiu criar mercados de dívida de longo prazo denominados em sua moeda local. O resultado é que as empresas são forçadas a fazer uma escolha perigosa: contrair dívidas em dólares, expondo-se a incompatibilidades na taxa de câmbio, ou contrair dívidas a curto prazo na moeda local e arriscar-se a incompatibilidades de vencimento e crises de liquidez.

A apresentação provocou fortes críticas e endossos. O ministro da Fazenda de El Salvador Manuel Hinds estava claramente a favor da dolarização. "É preciso ter um padrão de valor", disse Hinds, que contou que planejava recomendar ao futuro governo do presidente eleito Francisco Flores a dolarização completa da economia de El Salvador. "A população da América Latina já tem um padrão de valor: é o dólar."

Em monografia preparada para o seminário, Hinds qualificou as taxas de câmbio flexíveis de "praga" para a América Latina e comparou as devalorizações a amputação de membros. "Se não me acreditam, perguntem aos cidadãos do México e do Brasil que não conseguem pagar suas hipotecas, que perderam suas poupanças, que enfrentam taxas de juros altíssimas e uma incerteza drástica", afirmou ele em seu trabalho.

José Angel Gurría, o equivalente de Hinds no México, opôs-se veementemente à dolarização por considerá-la inapropriada e imprudente. "Uma nota de dólar com a cara de Colombo seria a solução? A resposta é não", disse ele. Embora tenha concordado em que a Argentina se beneficiou com um sistema de câmbio rígido que atava o peso ao dólar, Gurría argumentou em prol de um regime de câmbio flutuante como o que o México tem seguido desde a crise do peso de 1994.

O ministro da Fazenda do Chile Eduardo Aninat também se mostrou cético sobre a dolarização. Até uma recente diminuição no ritmo de crescimento causada pela queda nos preços do cobre, principal produto de exportação do Chile, seu país tinha conseguido um crescimento notável durante mais de uma década, mantendo ao mesmo tempo uma política de bandas cambiais que dava ao peso certa flexibilidade.

"Sou muito cético em relação a medidas extremas na regulamentação do câmbio", declarou.

O secretário de Economia Pablo Guidotti da Argentina, país que manteve com êxito uma política cambial do tipo caixa de conversão desde 1991 e analisou a possibilidade de passar para a dolarização, disse que outros países deveriam pesar os custos de manter as moedas nacionais. Com o argumento de que numa economia cada vez mais globalizada fazia pouco sentido ter que lidar com 180 moedas diferentes, o secretário argentino sugeriu que os países emergentes terão que eventualmente aceitar uma demanda decrescente de tal diversidade de moedas. "As tendências financeiras atuais indicam um decréscimo eventual no número de moedas", disse Guidotti. "Os mercados financeiros estão pedindo que encontremos meios de reduzir o risco e a incerteza."

O presidente do Banco Central do Brasil Armínio Fraga Neto observou que a taxa de câmbio fixa tinha funcionado para a Argentina tanto quanto um regime mais flexível funcionara para o Chile. O governo brasileiro, que em janeiro passado desvalorizara sua moeda depois de mantê-la por muitos anos num sistema de bandas cambiais, adotou a partir de então um sistema de câmbio flutuante. Fraga disse que o novo regime se adpata bem a um país do tamanho geográfico e econômico do Brasil. "Já temos décadas de experiência com o padrão-ouro, taxas de câmbio fixas, taxas flutuantes, e para mim a resposta não é tão óbvia. Não há nada que me diga que a América Latina é diferente de outras regiões", disse.

Em seu discurso, o subsecretário do Tesouro dos Estados Unidos Larry H. Summers disse que a dolarização poderá atrair alguns governos com a promessa de estabilidade, mas observou que os países que escolhessem esse curso teriam que estar preparados para aceitar as conseqüências.

"Não há substituto para a política nacional quando se trata de moldar os resultados nacionais", disse ele aos participantes do seminário.

Ao observar que a dolarização pode ajudar um país a integrar-se à economia mundial, o representante dos Estados Unidos lembrou que "significa também que o país precisa adotar maior disciplina".

Se um país decidir dolarizar, deve primeiramente engajar-se em consultas técnicas com funcionários do governo americano, disse Summers.

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