A Índia pode se tornar um mercado de rápido crescimento para mercadorias latino-americanas e caribenhas, mas os governos desta região precisam estimular vínculos mais estreitos com o gigante sul-asiático e reduzir os custos do comércio para aproveitar essa oportunidade, de acordo com um novo estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Com 1,1 bilhão de habitantes e uma escassez de recursos naturais em relação a outras nações de tamanho continental, a Índia tem o potencial de ser um grande importador de bens minerais e agrícolas, principais produtos de exportação da América Latina, segundo o estudo. Atualmente, a Índia representa apenas 0,8% do comércio exterior total dessa região, em comparação com 7,7% da China.
"India: Latin America’s Next Big Thing?
O livro “India: Latin America’s Next Big Thing?”, publicado pelo Departamento de Integração e Comércio do BID, examina o desenvolvimento recente e as tendências econômicas da Índia e seu possível impacto para a América Latina e Caribe. O estudo afirma que a Índia tem o potencial de repetir o recente desempenho econômico da China, que se tornou um mercado importante para exportações da América Latina e do Caribe, mas também criou um desafio para o setor manufatureiro da região.
“A região e a India estão cada vez mais juntos na mesa de negociações quando decisões importantes estão sendo tomadas,” disse o Presidente do BID Luis Alberto Moreno. “ Estamos começando a ver uma maior integração e há uma tremenda oportunidade para aumentar o comércio e a cooperação entre estas duas regiões. A América Latina e o Caribe encontra-se em posição de avançar com confiança para um futuro promissor e a Índia está cada vez mais interessada em ser um parceiro ativo nesse processo.”
Para incentivar o comércio, tanto a Índia como a América Latina precisam baixar as tarifas e as barreiras comerciais, conclui o estudo. A tarifa média da Índia para bens agrícolas latino-americanos é de 65%, mais de cinco vezes a tarifa de 12,5% da China. Embora as tarifas latino-americanas para produtos indianos não sejam tão altas — chegam a 9,8% no caso de produtos manufaturados, estão bem acima da faixa de 4% a 6% da OCDE, informa o estudo. Uma redução de 10% nas tarifas médias, por exemplo, provavelmente aumentaria as importações de bens indianos do Brasil e na Argentina em até 40% e 36%, respectivamente.
Além disso, a Índia e a América Latina precisam reduzir os custos do transporte. Atualmente, a Índia, ao contrário da China, não dispõe de serviços diretos de transporte de mercadorias para esta região. Os bens precisam ser transportados primeiro para Cingapura ou para a Europa, o que eleva tanto o preço do frete como o tempo de deslocamento. No caso do Brasil, por exemplo, despachar um produto de Santos diretamente para Mumbai levaria cerca de 27 dias e 15 horas. Despachar via Cingapura levaria aproximadamente 36 dias e 18 horas, quase nove dias a mais.
O livro estima que uma redução de 10% nas taxas de frete provavelmente aumentaria as importações de bens indianos do Brasil e Argentina em até 50% e 47%, respectivamente.
Fluxos de investimento
Os altos custos do comércio estão impedindo que a América Latina colha todos os benefícios de seu comércio atual com a Índia e restringindo o fluxo de investimentos entre as duas regiões. Hoje, um aumento de 1% no produto interno bruto da China gera um aumento de 2,4% nas exportações da região para o país. Enquanto isso, um aumento de 1% no PIB da Índia produz apenas um crescimento de 1,3% nas vendas da região para o país.
“A remoção da maioria dos obstáculos caros e óbvios ao comércio é uma ação de política que pode ser tomada no curto prazo,” disse o economista do BID Maurício Moreira Mesquita, que coordenou o estudo. “Com o comércio aproximando essas duas economias, os incentivos para investimentos entre a Índia e a América Latina e Caribe crescerão.”
O estudo do BID também recomenda que as duas regiões, que assinaram inúmeros acordos de cooperação cobrindo 21 setores econômicos na última década, aumentem as oportunidades para intercâmbio de lições valiosas de economia e desenvolvimento.
A Índia, por exemplo, pode oferecer lições importantes apoiadas em seu sucesso na criação de serviços dinâmicos de tecnologia da informação, dos prósperos setores de engenharia aeroespacial, microfinanças e indústrias farmacêuticas e universidades de primeira linha para formar seus líderes, entre outras realizações. A América Latina, por outro lado, pode fornecer histórias de sucesso em agricultura, mineração, aeronáutica, biocombustíveis, sistemas de previdência privada e programas de alívio da pobreza, que poderiam ajudar a Índia a lidar com alguns dos obstáculos ao seu crescimento econômico.
Desafio ao setor manufatureiro
O estudo do BID também identifica áreas em que a Índia poderia representar um desafio competitivo para a América Latina. Dada a grande população indiana e a pressão política para reduzir a pobreza, o estudo argumenta que o país provavelmente se especializará em bens manufaturados que façam uso intensivo de mão de obra, como fez a China.
A Índia tem hoje apenas uma fração do nível de participação da China nas importações dos Estados Unidos, com uma fatia de mercado de 1,7%, em comparação com 22,3% da China em 2008. Mas a Índia tem expandido sua presença em um ritmo extraordinário e sua participação hoje é maior que a do Brasil e da América Central, o segundo e terceiro maiores exportadores de bens manufaturados da América Latina.
Em termos de produtos de baixa tecnologia, a Índia tem ampliado suas exportações de têxteis e vestuário. Detêm hoje 3% do mercado norte-americano desses bens, o que é duas vezes a participação do Brasil (1,5%), mais que a da América Central (2,4%) e aproxima-se da fatia declinante do México (7%).
“O setor manufatureiro da América Latina e do Caribe terá que se preparar para outro grande choque competitivo assim que a Índia eliminar as barreiras que atualmente restringem as exportações intensivas de mão de obra’’, disse Moreira. “Esse cenário apenas aumenta a urgência de que os governos da região avancem em sua agenda de reformas para aumentar a produtividade.”
O estudo recomenda que os governos da América Latina e do Caribe melhorem a infraestrutura, expandam o acesso ao crédito e promovam investimentos maiores e mais eficientes em educação, ciência e tecnologia. Essas reformas permitirão que a indústria manufatureira da região tire proveito de seu mercado doméstico relativamente grande, das oportunidades de processamento e industrialização de recursos naturais e de sua proximidade com o mercado norte-americano para aumentar as exportações.
O estudo informa também que é mais provável que a Índia se torne um parceiro comercial do que uma ameaça para a região nas áreas de tecnologia da informação e serviços técnicos e comerciais especializados.
“A América Latina especializou-se em mercados de nicho, por sua proximidade física e cultural de grandes consumidores de TI, atraindo investimentos de empresas indianas em busca de diversificar seus negócios”, disse Moreira.