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Anticoncepção orgânica

Roger Hamilton

ACRE, BRASIL — Pessoas do mundo inteiro viajam até a cidade de Xapuri, no oeste da Amazônia, para visitar a casa de Chico Mendes, o defensor da floresta e de seu povo, que morreu assassinado. No caminho, perto da estrada principal, os visitantes passam por outra estrutura muito maior, de uma fábrica recém-construída.

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Seringueiros despejam látex líquido em moldes para produzir lâminas, que podem ser armazenadas ou transportadas com facilidade. A fábrica de preservativos, porém, precisa usar látex líquido.

A proximidade dessas duas construções não é uma coincidência. Chico Mendes lutou para proteger os direitos do povo que extrai os produtos naturais da floresta, entre eles o látex. Seu sonho sobrevive nos cerca de um milhão de hectares da Reserva Extrativista Chico Mendes, que foi criada como parte de um projeto financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento na década de 1980. A nova fábrica usará o látex coletado na reserva por 350 seringueiros para produzir preservativos masculinos.

A meta de produção inicial é de 100 milhões de preservativos por ano. A fábrica de Xapuri será a primeira produtora nacional de preservativos masculinos no Brasil. Os 600 milhões que o país produz anualmente são fabricados por empresas internacionais.

Com o início das operações marcado para o final deste ano, a fábrica de US$10,6 milhões produzirá os únicos preservativos do mundo feitos com látex extraído de uma floresta natural. Atualmente, o látex usado na fabricação de preservativos vem de plantações de seringueiras do Sudeste Asiático, nas quais se utilizam pesticidas, herbicidas e outros agroquímicos.

Um dos desafios da produção de preservativos com látex da floresta natural é que a matéria-prima precisa chegar à fábrica em estado líquido. Por essa razão, apenas famílias que vivem a uma distância relativamente curta da instalação podem participar do projeto. No processo tradicional, os seringueiros despejam o látex líquido em um molde e deixam-no secar até o estado sólido, o que lhes permite transportar o produto a qualquer momento e a qualquer distância.

Mais valor para a floresta natural. No início do último século, o Brasil era o maior produtor mundial de látex, que é usado para fabricar desde vários produtos essenciais na indústria bélica e de transportes até balões de brinquedo. Porém, o quase monopólio do látex natural brasileiro foi rompido depois que plantações industriais do outro lado do planeta mostraram-se bem mais econômicas do que árvores amplamente espaçadas na floresta natural. O látex que continua sendo produzido na Amazônia é fortemente subsidiado.

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Gota a gota, o látex enche o recipiente de lata do seringueiro.

O governo do estado do Acre promoveu a construção da fábrica, que será operada por uma empresa privada. As autoridades estaduais nutrem fortes esperanças de que um produto comercial como os preservativos – vendidos com sua marca distintiva de produto totalmente natural – venha acrescentar valor à floresta e incrementar a renda das famílias que vivem dela. Em anos recentes, as populações da floresta têm abandonado as “trilhas da borracha” que antes as sustentavam, conta João César Dotto, diretor da fundação de tecnologia semi-estatal que ajudou a desenvolver o processo de produção da fábrica. Ele quer, porém, que as pessoas continuem a ganhar a vida na floresta para fortalecer o argumento econômico em favor de sua proteção.

Embora os preservativos ainda não estejam à venda, o material promocional e amostras em embalagens verdes são presença de destaque nos gabinetes do governo estadual.

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