Por trás das paredes do que costumava ser um complexo industrial, havia uma espécie de descampado, coberto de ervas daninhas, metais oxidados e fachadas rachadas. Localizado no coração de São Luís – a maior cidade do Maranhão, este espaço parecia ter sido deixado à sua própria sorte. Mais de 4.800 metros quadrados abandonados, sem usar. Simplesmente esquecidos.
Até agosto deste ano, essa era a realidade do Complexo Santo Ângelo, no coração histórico de São Luís. Hoje, este espaço foi eleito como um elemento central para revitalizar esta área esquecida da cidade velha como parte de uma (inovadora) iniciativa que nasce, nada mais nada menos, que dos próprios cidadãos.
Entre 27 de agosto de 16 de setembro deste ano, os galpões deste complexo deixaram de ser invisíveis para se abrir aos vizinhos do centro histórico por 21 dias, como parte de uma iniciativa conhecida como LAB SLZ, desenvolvida por uma aliança entre o coletivo urbano Translab.urb de Porto Alegre, a prefeitura da cidade de São Luís e o Laboratório de Cidades, da Divisão de Habitação e Desenvolvimento Urbano do BID.
Leonardo Brawl, um dos nossos parceiros neste projeto, fala sobre como conseguimos recuperar um espaço perdido em São Luis.
“O mais bonito foi descobrir que uma população efetivamente vive aí. Que escolhe viver aí. E eles têm um nível de consciência urbanística muito empírico, que aportou muitíssimo ao projeto, tanto desde a perspectiva do espaço como arquitetonicamente”, disse Leonardo Brawl, parte da equipe de Translab.urb.
Durante estas três semanas, os são-luisenses fizeram uma imersão em diversas atividades de participação, moderadas e planejadas a partir desta aliança, e realizadas no terreno por Translab.Urb, com o apoio também da Galeria de Arte Trapiche, que fica ao lado do complexo. O fato de repensar o espaço a partir da perspectiva da cidadania era o núcleo principal deste projeto, pelo qual a participação cidadã foi chave para realizar e pensar as dinâmicas participativas durante estas três semanas. Os residentes e vizinhos do bairro foram partícipes das decisões sobre o que fazer com o espaço, como revitalizá-lo e aproveitá-lo para a comunidade.
Slideshow: O Antes e Depois do Complexo Santo Ângelo
“É diferente se eu te convido a ser parte disso como espectador. Não, aqui foram proponentes. Então essa dinâmica foi a chave mestras de todo o projeto”, disse Brawl.
A equipe de Leonardo desenhou e implementou mesas de discussão, sessões de ideias com vizinhos, painéis interdisciplinares, sessões didáticas e atividades artísticas que puderam incentivar a discussão sobre o que fazer com os galpões de vocação cultural e comunitária. Durante o período de três semanas, a chamada foi aberta, e tanto os vizinhos como as pessoas que trabalham na área puderam participar das atividades dos que se chamou Laboratório Urbano Efêmero, dada a temporalidade da intervenção.
Além dos vizinhos, as mesas de discussão e atividades do LAB SLZ convidaram integrantes do setor privado, movimentos sociais, ativistas urbanos, artistas, músicos, empreendedores, escolas tecnológicas, e assim decidir em conjunto o futuro do espaço.
“As pessoas tinham muitas perguntas. Foi excelente”, disse Brawl. “De fato, ao lado se encontra a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual do Maranhão e ninguém sabia do potencial e a escala deste lugar. Pessoas passavam por aí há anos e não tinham ideia deste espaço”.
O mais interessante deste experimento urbano é que as ideias e conclusões desenvolvidas durante essas três semanas serão a base principal das diretrizes e o projeto executivo, o que se encontra em processo de licitação e que definirá o futuro destes galpões e do patrimônio da cidade. Isso, dentro do marco do Programa de Revitalização do Centro Histórico de São Luís impulsionado pelo BID junto às autoridades locais da cidade, de modo que o que foi levantado nessas três semanas por parte dos cidadãos seja incorporado no projeto final, em caráter permanente.
Slideshow: Três Semanas de Participação Cidadã no Complexo
Aconteceu em outras cidades?
A participação cidadã em processos de revitalização do patrimônio urbano não é algo sumamente novo na América Latina e o Caribe, mas sim uma prática que não é habitual nos programas de governos locais. Um caso de sucesso aconteceu em Santiago do Chile, onde espaços patrimoniais estão sendo remodelados e recondicionados para servir aos cidadãos com o apoio do BID.
No caso chileno, um casarão patrimonial de 1898 foi parcialmente destruído pelo terremoto de 2010 deixando-o abandonado e inabitável. Em parceria com instituições chilenas, o BID abriu uma chamada a universidades da região para que desenvolvessem um projeto urbano integral de recuperação deste prédio patrimonial – conhecido como Hermanitas de Los Pobres, no bairro Matta Sur de Santigo do Chile. Este projeto já está nas etapas finais e premiará o ganhador da chamada no próximo dia 9 de dezembro deste ano.
A renovação de espaços públicos em nossas cidades é uma necessidade, já que o crescimento urbano e populacional da América Latina e o Caribe requer cada vez mais. A chave está em incluir o cidadão na tomada de decisões para assim desenvolver propostas mais democráticas e a partir de uma escala humana, onde a prioridade seja a qualidade de vida daqueles que habitam e disfrutam a cidade..
Se quer saber mais sobre essa iniciativa em São Luís, clique aqui.